Last updated: 1 Oct, 2020

Método de ensino e espiritual de Sri Aurobindo

A visão de mundo avançada de Sri Aurobindo, a espinha dorsal de Auroville, abrange as mais amplas áreas do self, da vida e outras. O caminho espiritual – ou sadhana –, como desenvolvido por ele, trabalha com uma combinação de uma disciplina psicológica voluntariamente adotada e várias práticas iogues. Já faz um século que ele declarou que “Toda a vida é Yoga”. O texto abaixo foi escrito pelo próprio Sri Aurobindo em 1934.

O ensino e o método de Sadhana de Sri Aurobindo

O ensino de Sri Aurobindo se inicia a partir dos antigos sábios da Índia que estão por detrás das aparências do universo, em que há a Realidade do Ser e a Consciência, um Self de todas as coisas, única e eterna. Todos os seres estão unidos nesse Self Único e Espiritual, mas divididos por uma certa separatividade psicológica da consciência, uma ignorância do seu verdadeiro Self e da Realidade na mente, na vida e no corpo. É possível por uma certa disciplina psicológica remover esse véu da consciência separativa e se tornar ciente do verdadeiro Self, da Divindade dentro de nós e de todos.

O ensino de Sri Aurobindo afirma que esse Ser Único e Consciente está envolto aqui na Matéria. A evolução é o método pelo qual ele se liberta; a consciência se manifesta no que parece ser inconsciente, e uma vez que se manifesta, ela é autoimpelida a crescer cada vez mais e ao mesmo tempo a crescer e a se desenvolver em direção a uma perfeição cada vez maior. A vida é o primeiro passo para liberar a consciência; a mente é o segundo; mas, a evolução não termina com a mente, ela aguarda a liberação em algo maior, uma consciência que é espiritual e supramental. O próximo passo da evolução deve ser para o desenvolvimento da Supermente e do Espírito como um poder dominante no ser consciente. Apenas então a Divindade envolvida nas coisas se libertará inteiramente e se tornará possível à vida manifestar a perfeição.

Porém, enquanto os passos anteriores na evolução foram conduzidos pela Natureza sem um desejo consciente na vida das plantas e dos animais, no homem a Natureza se torna capaz de ser envolvida por um desejo consciente no instrumento. Não é, no entanto, pelo desejo mental no homem que isso pode ser completamente realizado, a mente vai apenas a um certo ponto e, após isso, somente pode se mover em um círculo. Uma conversão tem de ser feita, uma virada da consciência pela qual a mente tem de mudar para o princípio superior. Esse método é encontrado por meio da antiga disciplina psicológica e pela prática de Yoga. No passado, isso foi tentado por um afastamento do mundo e de um desaparecimento na altura do Self ou do Espírito. Sri Aurobindo ensina que uma descida do princípio superior é possível, que não liberará meramente o Self espiritual para fora do mundo, mas liberará no mundo, substituindo a ignorância da mente ou o seu conhecimento muito limitado por uma Verdade-Consciência supramental que será um instrumento suficiente do Self interior e que torna possível ao ser humano encontrar a si mesmo dinamicamente, bem como intimamente e crescer além de sua humanidade ainda animal em uma raça divina. A disciplina psicológica da Yoga pode ser usada para esse fim ao abrir todas as partes do ser por uma conversão ou transformação por meio do declínio e do funcionamento do ainda oculto princípio supramental superior.

Isto, entretanto, não pode ser realizado de uma vez ou em um curto tempo ou por qualquer transformação rápida e miraculosa. Muitos passos têm de ser tomados por aquele que procura antes que o declínio supramental seja possível. O homem vive majoritariamente em sua mente, vida e corpo superficiais, mas há um ser interno dentro dele com possibilidades maiores para o que ele tem de despertar – para esse há apenas uma influência muito restrita disso, que ele recebe agora e que o empurra para uma busca constante por uma beleza, por uma harmonia, por um poder e por um conhecimento maiores. O primeiro processo de Yoga é, portanto, para abrir os alcances deste ser interno e para viver de lá para fora, governando a sua vida exterior por uma luz e por uma força internas. Ao fazer isso ele descobre em si mesmo a sua verdadeira alma que não é essa mistura de elementos mentais, vitais e físicos, mas algo da Realidade por trás deles, uma fagulha do Fogo Divino. Ele tem de aprender a viver em sua alma e se purificar, e orientado por seu impulso em direção à Verdade, o descanso da natureza. Pode seguir após uma abertura ascendente e descente de um princípio superior do Ser. Porém, mesmo assim não é de uma vez só a Luz e a Força supramentais completas. Para isso há diversos alcances da consciência entre a mente humana comum e a Verdade-Consciência supramental. Esses alcances intermediários têm de ser abertos e os seus poderes trazidos para o interior da mente, da vida e do corpo. Apenas mais tarde o poder completo da Verdade-Consciência funciona na natureza. O processo dessa autodisciplina ou Sadhana é, portanto, longo e difícil, mas mesmo um pouco disso é ganho, porque torna a libertação e a perfeição finais mais possíveis.

Há muitas coisas que pertencem aos mais velhos sistemas que são necessários no caminho – uma abertura da mente para uma amplidão maior e no sentido do Self e do Infinito, uma emergência para dentro do que tem sido chamado de consciência cósmica, um domínio sobre os desejos e as paixões; um ascetismo exterior não é essencial, mas a conquista do desejo e do apego e o controle sobre o corpo e suas necessidades, ganâncias e instintos é indispensável. Há uma combinação dos princípios dos velhos sistemas, o caminho do conhecimento por meio do discernimento da mente entre a Realidade e a aparência, o caminho do coração de devoção, amor e entrega e maneira de trabalhar para afastar o desejo de motivos de autointeresse para a Verdade e a serviço da Realidade maior do que o ego. O ser por completo tem de ser treinado de forma que possa responder e ser transformado quando for possível para a Luz e a Força maiores para trabalhar na natureza.

Nessa disciplina, a inspiração do Mestre, e nos estágios difíceis o seu controle e a sua presença são indispensáveis – pois seria impossível de outra forma passar por isso sem muitos tropeços e erros, o que impediria todas as chances de sucesso. O Mestre é aquele que se elevou a uma consciência e a um ser superiores e ele é frequentemente considerado como a sua manifestação ou o seu representante. Ele não apenas ajuda com os seus ensinamentos e ainda mais com sua influência e exemplo, mas por meio um poder de comunicar as suas próprias experiências aos outros.

Este é o ensinamento e o método de prática de Sri Aurobindo. Não é o seu objetivo desenvolver qualquer religião ou amalgamar as antigas religiões ou encontrar qualquer nova religião – quaisquer dessas coisas conduziriam a um afastamento da proposta central. O único objetivo da sua Yoga é um autodesenvolvimento interior pelo qual cada um que a segue pode, a seu tempo, descobrir o Self Único em tudo e evoluir a uma consciência superior em relação à consciência mental, espiritual e supramental, que transformará e divinizará a natureza humana.

Sri Aurobindo, agosto de 1934

Biblioteca do Centenário de Nascimento de Sri Aurobindo

Vol. 26, "Sri Aurobindo por Ele Mesmo" (tradução livre para "Sri Aurobindo on Himself", no título original em inglês)

pp. 95-97. ©1999-2000, Copyright Sri Aurobindo Ashram Trust

(Portuguese translation by Pablo Antunes)